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Os direitos do investidor em operações de venture capital

10/9/24
mão interagindo com um tablet digital que exibe um gráfico com linhas flutuantes

No âmbito de um investimento de venture capital, o objetivo do investidor é realizar um aporte financeiro em uma startup para impulsionar o seu crescimento e, em contrapartida, obter um retorno financeiro no momento de um evento de liquidez. Tal investimento costuma ser realizado por meio de contratos de investidor-anjo, mútuo conversível ou opção de compra, nos quais o aporte realizado pelo investidor se converte, futuramente, em participação societária na startup.

No momento da conversão ou do exercício do direito de compra de participação societária e consequente ingresso no capital social, o investidor deve aderir ao acordo de sócios, se já existente, ou celebrar um novo acordo com os demais. O acordo irá definir os direitos e responsabilidades dos sócios, incluindo o investidor. Desse modo, além de prever os direitos mínimos garantidos por lei, como o direito de preferência no caso de subscrição de ações, é crucial que o investidor negocie todos os seus direitos no momento da formalização do investimento.

Nesse contexto, surge a pergunta: quais são os mecanismos para a proteção dos interesses do investidor, e quais são os principais direitos e condições que devem estar previstos no respectivo contrato e no acordo de sócios?

Direito de Venda Conjunta (Tag-Along): O tag-along é um mecanismo que se destina a proteger os sócios minoritários, que geralmente é a posição do investidor em operações de venture capital. Esse mecanismo, via de regra incluído no acordo de sócios, garante que, em caso da venda de participação societária, um sócio minoritário possa exigir que a sua participação também seja incluída na venda negociada pelo sócio majoritário, nos mesmos termos e condições ofertados a ele.

Particularmente para investimentos de venture capital, nos quais o risco é mais elevado, o tag-along costuma ser aplicado à venda de participação pelo fundador do negócio. Isso porque, muitas vezes, especialmente em rodadas de series pre-seed e seed, o investidor decide investir não apenas no negócio ou produto oferecido pela startup, mas também nos seus fundadores e na promessa de negócio por eles apresentada. Se os fundadores decidirem vender suas participações, principalmente em um estágio inicial, o investimento pode perder valor. Nesse cenário, o tag-along oferece ao investidor uma forma de saída segura e líquida.

Cláusula de Lock-up: Com a mesma premissa de que o investimento muitas vezes depende do fundador, e que o serviço ou produto da startup é influenciado por ele, a cláusula de lock-up se torna essencial. Esse tipo de cláusula impede o fundador de vender sua participação por um período pré-estabelecido, seja a partir da data do investimento até um prazo específico ou até o alcance de uma meta pré-determinada pelas partes, tornando as quotas ou ações indisponíveis até que tal condição seja cumprida. Na hipótese de descumprimento da cláusula de lock-up, podem ser previstas penalidades, como multas ou a emissão de opção de compra em relação à participação do fundador por um preço pré-fixado, que pode estar abaixo da avaliação da startup (valuation) no momento do descumprimento.

Ademais, é importante que esta modalidade de cláusula seja exclusiva para os fundadores, não podendo ser aplicada ao investidor, garantindo a ele uma liberdade de vender sua participação, caso deseje.

Direito de Anti-Diluição: A eventual diluição da participação societária, principalmente quando o investimento é realizado em rounds iniciais de investimento, é uma preocupação constante para o investidor. A cláusula de proteção anti-diluição objetiva preservar a participação do investidor em casos de novas rodadas de investimento a valuations inferiores (downrounds). Esse mecanismo pode operar de várias formas, sendo a mais comum a previsão de uma fórmula para calcular a quantidade de novas quotas ou ações que o investidor terá direito a receber (por meio de exercício ou conversão) por valor nulo ou inferior, compensando, assim, a sua diluição.

Preferência de Liquidação (Liquidation Preference): A preferência de liquidação é um direito que garante ao investidor, na ocorrência de um evento de liquidez como dissolução, aquisição, IPO, troca de controle, dentre outros, receber um determinado valor antes de qualquer outro sócio. Esse valor pode ser definido como o valor equivalente ao valor do investimento corrigido monetariamente ou um múltiplo desse investimento. Os valores remanescentes são posteriormente divididos proporcionalmente entre os demais sócios.

O valor e os termos da preferência de liquidação são geralmente negociados com base nos riscos inerentes ao investimento: quanto maior o risco, maior o retorno esperado.

Representação no Conselho: ter representatividade na administração da empresa é uma forma do investidor garantir que estará envolvido nas principais decisões estratégicas da empresa. Essa representatividade pode ser obtida por meio da indicação de um ou mais membros para o conselho de administração da startup, o que permite ao investidor contribuir diretamente para o desenvolvimento do negócio e proteger o seu investimento.

Para investidores com participações menores que não realizam um aporte significativo, pode não ser possível negociar a indicação de um membro para o conselho de administração. Nesses casos, existe a figura do “membro observador”, que permite ao investidor indicar um representante para acompanhar as deliberações e decisões tomadas nas reuniões do conselho, mas sem que esse representante tenha direito a voto.

Direito de Veto e Voto Afirmativo: O direito de voto afirmativo garante que determinadas matérias apenas sejam aprovadas com o consentimento do investidor, seja em assembleias gerais ou reuniões de conselho. Esse direito oferece ao investidor controle sobre decisões críticas da startup que possam impactar o negócio. O direito deve ser previsto no acordo de sócios, sendo indicado expressamente e de forma taxativa todas as matérias que exigem voto afirmativo do investidor.

Já o direito de veto, ao contrário do voto afirmativo, possibilita ao investidor abster-se de votar sobre determinadas matérias. Para exercer o veto, o investidor deve manifestar-se expressamente; caso contrário, a ausência de manifestação poderá ser interpretada como aprovação tácita da matéria.

Além dos direitos e mecanismos mencionados, também são relevantes o direito de acesso às informações operacionais e financeiras da sociedade e a cláusula de finalidade do investimento (use of proceeds). Esses mecanismos ajudam a monitorar o progresso do negócio e, consequentemente, proteger o investimento.

Em um investimento de venture capital, é crucial que o investidor esteja atento aos direitos que garantem a proteção do seu aporte e o alinhamento de interesses com os demais sócios. Negociar direitos como a proteção contra anti-diluição, lock-up, o tag-along, a preferência de liquidação e a representatividade no conselho são medidas essenciais para garantir que o investimento, em um ambiente de alto risco, tenha o retorno esperado.

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