Introdução:
O presente artigo traz um estudo sobre os desafios da Resolução de Diretoria Colegiada (RDC 824/2023) que alterou a RDC nº 786, de 5 de maio de 2023, as quais dispõem sobre os requisitos técnico-sanitários para o funcionamento de Laboratórios Clínicos, de Laboratórios de Anatomia Patológica e de outros Serviços que executam as atividades relacionadas aos Exames de Análises Clínicas (EAC) e dá outras.
Aspectos da RDC 824/2023:
A norma em referência visa estabelecer os requisitos técnico-sanitários para o funcionamento de Laboratórios Clínicos, de Laboratórios de Anatomia Patológica e de outros Serviços que executam as atividades relacionadas aos Exames de Análises Clínicas (EAC) e dá outras providências. No que se refere às campanhas de controle de doenças e prevenção, os Exames de Análises Clínicas (EAC) poderão ser executados nos ambientes definidos pelo Ministério do Distrito Federal, desde que assegurado o cumprimento dos demais requisitos desta Resolução, observadas as especificidades aplicáveis ao Sistema Único de Saúde (SUS), conforme previsto em seu artigo 5º.
A inovação trazida com a resolução refere-se à possibilidade de realização de Exames de análises clínicas em consultórios e farmácias. Para tanto, os estabelecimentos deverão observar os critérios sanitários definidos. É importante observar que tais exames de análises clínicas não possuem a finalidade de fornecer um diagnóstico. Logo, a realização de consulta e acompanhamento por um profissional de saúde habilitado é imprescindível.
Além disso, as resoluções em debate causam impacto direto nas políticas públicas da ANVISA e Ministério da Saúde, os quais trabalharão de forma colaborativa, com o objetivo de acompanhar e avaliar o desempenho da intervenção regulatória, em especial o alcance e o seu respectivo impacto no SUS (Sistema único de Saúde) e na sociedade com um todo. A RDC 824/2023 foi implementada com o objetivo de aperfeiçoamento da RDC 786/2023. Foram identificados no curso das deliberações, cinco questões que mereciam destaque e alterações no texto da primeira resolução: a) definição do termo “material biológico primário”; b) especificação nas condições de envio/transporte/acondicionamento de material biológico pelo paciente; c) exigência de informação referente ao Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES) no laudo laboratorial; d) informações obrigatórias na embalagem terciária de materiais biológicos; e a e) limitação da abrangência da norma.
A polêmica em torno da intervenção regulatória reside na problemática do aumento da automedicação, o que é considerado algo a ser combatido em nosso País. Contudo, os serviços referenciados na resolução devem ser executados por profissionais habilitados pelos seus respectivos Conselhos Profissionais, criados por lei federal inexoravelmente e observados os requisitos técnicos, nos termos dos Códigos de Ética Profissionais. A execução dos exames de análises clínicas nas farmácias caberá ao farmacêutico para a realização de uma triagem, o que não se confunde com diagnóstico.
Nesse mesmo sentido, qualquer farmácia poderá oferecer a realização de exames de análises clínicas desde que registradas junto ao órgão de vigilância sanitária local.
Impactos da RDC 824/2023 com a Legislação sobre a Propriedade Industrial no Brasil
A Resolução 824/2023 introduz significativas mudanças ao permitir a realização de Exames de Análises Clínicas (EAC) em ambientes não tradicionais como farmácias e consultórios médicos. Essa abertura regulatória cria um terreno fértil para o desenvolvimento e implementação de novas tecnologias diagnósticas que são adaptadas especificamente para esses novos contextos.
De acordo com a Lei de Propriedade Industrial (Lei nº 9.279/1996), para que uma invenção seja patenteável, ela deve satisfazer critérios específicos de novidade, atividade inventiva e aplicabilidade industrial, conforme estabelecido no Artigo 8º1. Isso implica que qualquer novo dispositivo ou método desenvolvido para executar EAC em farmácias e consultórios deve apresentar um elemento de novidade; ou seja, não pode ser algo já conhecido no estado da técnica. Além disso, deve envolver um passo inventivo que não seja óbvio para um profissional do ramo, e ser capaz de ser usado ou fabricado na indústria.
Importante destacar que o Artigo 102 da mesma lei estabelece claramente o que não é considerado uma invenção ou modelo de utilidade, excluindo princípios, planos ou métodos em diversas áreas, incluindo comerciais e educativos. No entanto, essa exclusão não se aplica a dispositivos físicos ou métodos técnicos que são implementados para realizar um processo. Assim, embora um plano comercial para a implementação de EAC em farmácias não seja patenteável, um dispositivo inovador ou um método técnico desenvolvido especificamente para permitir ou facilitar esses exames em tais ambientes pode ser elegível para proteção por patente.
Dessa forma, a RDC 824/2023 não apenas expande as possibilidades de serviços de saúde disponíveis em locais mais acessíveis ao público, mas também incentiva a indústria a inovar dentro de parâmetros claramente definidos pela legislação de propriedade industrial. Fabricantes de equipamentos médicos e desenvolvedores de tecnologia podem agora explorar novas áreas de pesquisa e desenvolvimento, criando soluções que se ajustem aos requisitos específicos e às limitações dos novos espaços de realização dos EAC.
Esse estímulo à inovação pode resultar em benefícios significativos para a saúde pública, ampliando o acesso a diagnósticos rápidos e precisos, e ao mesmo tempo promover um mercado mais competitivo e diversificado no campo da tecnologia médica. As patentes concedidas nesse novo contexto garantirão que os investimentos em inovação sejam protegidos, ao mesmo tempo em que impulsionam o avanço tecnológico no setor de saúde.
Ainda, com a expansão dos serviços de EAC para farmácias, a diferenciação de mercado através de marcas torna-se uma estratégia importante. O Art. 1233 da Lei nº 9.279/1996 define o que pode ser registrado como marca, e as farmácias podem usar isso para desenvolver marcas próprias para seus serviços de saúde. O registro de marcas é essencial para evitar conflitos e garantir a exclusividade no uso das mesmas.
Conclusão:
A RDC 824/2023 abre novas possibilidades para a realização de exames de análises clínicas em ambientes menos convencionais, como farmácias e consultórios. Este novo regulamento não só expande o acesso a serviços de saúde mas também promove uma interação significativa com a Lei de Propriedade Industrial. Enquanto esta mudança promete fomentar a inovação, também impõe desafios relacionados à gestão de propriedade intelectual, exigindo uma abordagem cuidadosa para harmonizar os interesses de saúde pública com a proteção dos direitos de propriedade industrial.
As informações pormenorizadas desse processo regulatório está disponível no site da Anvisa: Página inicial — Agência Nacional de Vigilância Sanitária - Anvisa (www.gov.br). Para dúvidas adicionais, entrar em contato com a Central de Atendimento da Anvisa: https://www.gov.br/anvisa/pt-br/canais_atendimento.
Notas:
1 Art. 8º É patenteável a invenção que atenda aos requisitos de novidade, atividade inventiva e aplicação industrial.
2 Art. 10. Não se considera invenção nem modelo de utilidade:
I - descobertas, teorias científicas e métodos matemáticos;
II - concepções puramente abstratas;
III - esquemas, planos, princípios ou métodos comerciais, contábeis, financeiros, educativos, publicitários, de sorteio e de fiscalização;
IV - as obras literárias, arquitetônicas, artísticas e científicas ou qualquer criação estética;
V - programas de computador em si;
VI - apresentação de informações;
VII - regras de jogo;
VIII - técnicas e métodos operatórios ou cirúrgicos, bem como métodos terapêuticos ou de diagnóstico, para aplicação no corpo humano ou animal; e
IX - o todo ou parte de seres vivos naturais e materiais biológicos encontrados na natureza, ou ainda que dela isolados, inclusive o genoma ou germoplasma de qualquer ser vivo natural e os processos biológicos naturais.
3 Art. 123. Para os efeitos desta Lei, considera-se:
I - marca de produto ou serviço: aquela usada para distinguir produto ou serviço de outro idêntico, semelhante ou afim, de origem diversa;
II - marca de certificação: aquela usada para atestar a conformidade de um produto ou serviço com determinadas normas ou especificações técnicas, notadamente quanto à qualidade, natureza, material utilizado e metodologia empregada; e
III - marca coletiva: aquela usada para identificar produtos ou serviços provindos de membros de uma determinada entidade.
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