A capacidade de atração de investimentos é elemento central ao desenvolvimento e crescimento de qualquer setor econômico, aspecto que é influenciado por diversos fatores. Quando se trata da implantação de projetos de mineração, a preocupação com a existência de elementos que aumentem a atratividade do negócio parecer ser ainda relevante.
Desde a (considerável) possibilidade de sequer ser encontrado recurso mineral economicamente viável na fase de prospecção, ao longo período de incertezas até efetiva lavra, a atividade de mineração envolve fatores capazes de afastar até mesmo aqueles investidores menos sensíveis ao risco.
Levando-se em conta que a viabilização de projetos minerários, em regra, demanda grandes investimentos para o seu financiamento, a existência de elementos que agreguem atratividade ao negócio, em contrapartida aos riscos envolvidos, é uma necessidade indiscutível. Fator relevante nesse contexto é o estabelecimento de garantias ao investidor, com o intuito de conferir maior segurança à operação.
Além das garantias comumente oferecidas em qualquer negócio, no caso da mineração, a possibilidade de oferecimento dos próprios títulos minerários pode representar atrativo bastante significativo1. Do ponto de vista da segurança trazida, a oneração do título minerário garante, no mínimo, que o investidor não será surpreendido com a sua cessão (venda) a terceiros alheios ao negócio.
A possibilidade de oneração das Concessões de Lavra sempre foi prevista pelo Código de Mineração (Decreto-Lei n°227/1967), mas, embora o próprio diploma exigisse a averbação do gravame para fins de validade (atualmente, realizada pela Agência Nacional de Mineração – ANM), o procedimento e limites ligados ao oferecimento dos títulos minerários era algo bastante confuso. A dúvida não era, apenas, se somente as Concessões de Lavra poderiam ser oneradas – excluindo-se, por exemplo, os títulos de pesquisa –, mas propriamente em relação ao procedimento que deveria ser seguido para registro do ônus.
Destaca-se que o registro da garantia, permitindo que o ato se torne público, é requisito central para que a oneração do título minerário possa alcançar o seu objetivo precípuo: proporcionar maior segurança ao investidor. Como destaca Tiago de Mattos2, o registo da garantia “dá publicidade ao negócio e evita que terceiros, que também venham a negociar com o credor originário, aleguem desconhecimento do ônus imposto ao título minerário”.
Após anos de demandas do setor minerário, em 2021, a ANM editou a Resolução n°90/2021, regulamentando o procedimento e as hipóteses de oferecimento de títulos minerários em garantia para o financiamento de operações minerárias.
Embora tenha excluído de suas hipóteses títulos importantes como as autorizações de pesquisa, fixando que somente as Concessões de Lavra e Manifestos de Mina podem ser onerados3, a Resolução trouxe luz ao cenário de insegurança e inoperabilidade das garantias, ao estabelecer, por exemplo, (i) a impossibilidade de arrendamento dos títulos onerados sem a anuência expressa do credor, assim como a (ii) vedação à renúncia e à prática de atos, pelos titulares, que comprometam a continuidade da operação. A norma também dispõe sobre a possibilidade de o próprio credor atuar, diretamente, com o objetivo de evitar o perecimento do título minerário dado em garantia, evitando-se que o projeto seja inviabilizado pelo descumprimento das obrigações inerentes às Concessões de Lavra e Manifestos de Mina.
A Resolução n° 90/2021 também dispõe acerca dos requisitos formais e procedimento específico para o registro das garantias, além da forma com que se dará a sua execução e respectiva transferência da titularidade do título minerário, em caso de descumprimento das obrigações garantidas. A transferência, vale destacar, somente se dará por meio de execução judicial ou venda amigável do título, e dependerá da anuência prévia e averbação por parte da ANM, sendo necessário que o sucessor atenda aos requisitos legais para assumir a titularidade (previstos no artigo 176, § 1º da Constituição, e no art. 38, inciso I do Código de Mineração).
Ponto importante que não foi muito bem esclarecido pela norma consiste na possibilidade de direcionamento dos recursos recebidos para projetos ligados a títulos minerários diferentes daqueles dados em garantia. De todo modo, considerando que a Resolução apenas estabelece a obrigatoriedade de que os investimentos sejam destinados a empreendimentos minerários, a resposta nos parece ser positiva, o que possibilita um maior leque de opções para as negociações entre investidor e minerador.
A hipótese é relevante por possibilitar, por exemplo, que operações ainda em fase de pesquisa possam receber recursos impulsionados pelo oferecimento de outros títulos em garantia.
Do ponto de vista prático, vale destacar que o oferecimento de títulos minerários em garantia, em razão das suas peculiaridades, demanda cuidados específicos por parte dos investidores, tais como:
- Realizar diligências detalhadas sobre o título: É importante verificar a situação jurídica do título, a existência de ônus e gravames, e a viabilidade do projeto minerário.
- Considerar outros tipos de garantias: Além da oneração do título, o investidor pode solicitar outras garantias, como royalties ou participação societária, para aumentar a segurança da operação.
- Análise de outros elementos ligados à operação: É essencial que as financiadoras se atentem à existência de passivos ligados ao empreendimento, como aqueles ligados a temas ambientais e sociais (existência de comunidades tradicionais etc.).
Observados os cuidados necessários, o oferecimento de títulos minerários em garantia, ao agregar maior segurança em meio aos riscos inerentes ao negócio, é um fator sem dúvida capaz de gerar maior atratividade para investimentos em projetos de mineração, impulsionando o crescimento do setor que é essencial ao desenvolvimento nacional.
Notas
1 De acordo com Pedro Ataíde: “Além da cessão e transferência, é prevista a possibilidade de oneração de direitos minerários. Em virtude dos pressupostos econômicos (alto risco do empreendimento e exigência de altas taxas de retorno), a atividade minerária muitas vezes exige vultosos investimentos.”(ATAÍDE, Pedro. Direito Minerário. São Paulo: Juspodivm, 2022)
2 SILVA, Tiago de Mattos. Rembrandt e os títulos minerários em garantia. JOTA, 2021 (artigo). Disponível em: < https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/mineral/rembrandt-e-os-titulos-minerarios-em-garantia-31012021/>.Acesso em 03 ago. 2023
3 É importante destacar que a Lei n° 14.514/2022, recentemente, incluiu o art. 92-A no Código de Mineração, trazendo autorização expressa de que, além das Concessões de Lavra e Manifestos de Mina, o Alvará de Pesquisa, os títulos em regime de licenciamento e as Permissões de Lavra Garimpeira, também podem ser onerados e oferecidos em garantia. Contudo, a ANM ainda não editou nova norma ou alterou a Resolução n° 90/2021, de maneira que ainda carece de regulamentação a oneração de tais títulos.
--------------------
Créditos da Imagem: Freepik